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1 DE SETEMBRO DE 2014

Para compreender a depressão

A OMS, em parceria com o ilustrador Matthew Johnstone, produziu uma animação que mostra de forma simples e direta o que é a doença.

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publicado em 28/7/2014
‘A depressão está sempre ali de alguma forma’, diz Andrew Solomon

Mais de uma década depois do lançamento do livro ‘O demônio do meio-dia’, escritor revela que ainda sofre com a doença

Publicado no jornal O Globo – 27/07/2013

Por Viviane Nogueira

O autor americano Andrew Solomon: "A depressão me colocou em contato com o mistério da experiência humana, me ensinou a fazer o máximo nos dias em que eu não estou deprimido."

O autor americano Andrew Solomon: “A depressão me colocou em contato com o mistério da experiência humana, me ensinou a fazer o máximo nos dias em que eu não estou deprimido.”

Quando o livro “O demônio do meio-dia” surgiu, em 2001, houve quem o considerasse um tratado sobre depressão. Venceu o National Book Award e foi finalista do prêmio Pullitzer, além de um dos 100 melhores da década segundo o diário inglês “The Times”. Agora a Companhia das Letras o relança com a presença do autor, o americano Andrew Solomon, na Flip.

Como o senhor revê seu livro hoje? O Andrew Solomon atual ainda se reconhece ali?
Sim. Eu ainda tenho depressão, ainda tomo remédios e faço tratamento. Há muito tempo não tenho uma daquelas crises catastróficas em que não conseguia me mexer. Definitivamente é uma parte do que eu sou, e ter escrito um livro sobre o tema não foi só para ajudar as pessoas, mas para me lembrar de como foi sério, para que nunca pudesse me esquecer de que não seria quem eu sou hoje se não tivesse passado por aquilo.

O senhor diz que o livro o transformou em um depressivo profissional. Isso é não é um pouco perigoso?
Pode ser um pouco cansativo. Eu escrevo no mínimo três cartas por dia para pessoas que visitam meu site e contam suas experiências com a doença. Virei uma espécie de confidente, e, de uma certa forma, é maravilhoso. Às vezes recebo as cartas e vejo que consigo ajudar as pessoas, é ótimo, especialmente aquelas que não estão recebendo tratamento adequado. Mas, quando estou deprimido, é um fardo ouvir os relatos de desespero dessas pessoas sobre a doença.

No epílogo da nova edição, escreveu sobre seus filhos, dizendo que são “antidepressivos”. Ser pai lhe tirou o direito de morrer?
Sim, certamente. Eu sempre pensei que, se fosse para ter filhos, eu deveria estar presente, ser responsável e não estaria autorizado a morrer ou a me fechar no meu universo particular. Se tivesse outra depressão aguda como a que tive em 1994, acho que estaria perdido, não posso submeter crianças pequenas a um pai que não consiga lidar com as coisas. Quando isso acontece, não há o que fazer, e ter tido filhos não evita a minha depressão, mas me motiva a lidar com ela da melhor maneira possível.

Quais as idades dos seus filhos hoje?
George tem 5 anos, Blaine tem 6 anos e meio, Oliver e Lucy, que são filhos biológicos do John e fazem muito parte das nossas vidas, têm 10 e 14 anos.

Tem medo que a doença se manifeste em seus filhos biológicos?
Essa é uma das coisas que mais me preocupam. Todos temos uma característica negativa que passamos para os filhos. E eu me preocupo que seja essa a que eu venha a passar para eles.

O senhor teve outros colapsos depois do lançamento do livro, em 2001?
Não aqueles em escala monumental, mas houve períodos em que me senti sobrecarregado, tive crises de ansiedade e situações em que sabia que não estava 100%. Tive um episódio de depressão quando meu novo livro (”Longe da árvore”, em que trata da própria homossexualidade) foi lançado, em 2012. A vulnerabilidade de mostrar ao mundo um trabalho que fiz durante 11 anos foi terrivelmente difícil, comecei a ter crises de pânico e sentia como se não as estivesse superando. Voltei aos meus médicos, ajustei os medicamentos… A depressão está sempre ali de alguma forma.

A capa da nova edição do livro "O demônio do meio-dia"

A capa da nova edição do livro “O demônio do meio-dia”

Como está hoje?
Tomo meus remédios, vou ao psicoterapeuta e tento ajustar minha vida a coisas que acho realmente importantes: procuro dormir bem, não bebo muito álcool e me alimento de forma balanceada, mas acho que, se eu não tomasse os remédios, estaria com problemas. A diferença agora é que tenho uma grande rede de apoio, com pessoas que sabem tudo sobre depressão e têm meu histórico da doença. Toda vez em que não me sinto muito bem, posso recorrer ao John porque ele é muito bom para cuidar de mim nessas circunstâncias vulneráveis. Eu não tenho mais a sensação que costumava ter quando estava deprimido, a sensação de que estar perdido e sozinho no mundo.

O senhor costuma escrever que o amor ajuda…
Não é uma prescrição muito útil para momentos de crise: “ah, está deprimido, seria bom se mais pessoas o amassem” (risos). Mas se sentir amado e forte é uma defesa não contra a depressão biológica, mas contra os sintomas.

Uma das críticas aos remédios de depressão é que eles paralisam o paciente. O que suas pesquisas em medicamentos dizem disso?
Em primeiro lugar eu diria que os remédios que temos hoje são ótimos. Há 15 anos eu não poderia ter a vida que tenho hoje, passaria muito mais tempo em terrível depressão. Ao mesmo tempo são uma marreta, acho que quando meus netos nascerem vão me dizer “não acredito que você tinha que tomar essas drogas terríveis”. Os remédios são maravilhosos e úteis mas tem vários efeitos colaterais, não há como negar. Mas para as pessoas que estão tomando remédio sem ver efeito sobre a doença, eu diria que estão tomando os remédios errados, ou uma combinação errada de medicamentos, porque o que os remédios devem fazer e fazem por mim é colocar as emoções em uma escala certa. Quando eu estava deprimido, ficava assustado com a ideia de tomar banho ou almoçar ou retornar um telefonema; hoje tenho esse sentimento pelo horror do que acontece em Gaza ou Israel, ou pelas relações interpessoais que dão errado, ou pelo aquecimento global e o que está acontecendo com nosso planeta.

O que a depressão o ensinou sobre si mesmo?
Eu acho que me ensinou que às vezes a mente e o humor podem ficar mais significativos que a realidade. E que o relacionamento entre o que você é física e biologicamente X espiritual e intelectualmente é complicado ao ponto de ninguém ser capaz de entender ou descrever. A depressão me colocou em contato com o mistério da experiência humana, me ensinou a fazer o máximo nos dias em que eu não estou deprimido. Todos os dias em que acordo me sentido bem são um assombro. E acho que me ensinou compaixão por outras pessoas. Eu cresci em um ambiente confortável, tive altos e baixos, lidei com eles mas acho que de forma geral sempre estive muito protegido. E ter essa experiência me mostrou como é estar totalmente desamparado, o que me faz lidar melhor não só com as pessoas que sofrem de depressão, mas com as que têm deficiências, falta de instrução, de oportunidade, de habilidade, com todas as outras coisas que tornam as pessoas vulneráveis das maneiras mais variadas.

Mais de 350 milhões de pessoas têm depressão, 5% da população mundial, dados da OMS de 2012, de lá pra cá deve ter aumentado. E ainda é uma doença que sofre preconceito ou deixa parentes e amigos desconfiados e desconfortáveis?
Eu acho que deixa alguns parentes e amigos desconfortáveis, e não dá para saber de antemão quais serão. Quando eu tive a minha primeira crise, procurei uma amiga que eu tinha desde os 12 anos de idade, mas ela não soube lidar comigo, se afastou de mim por um longo tempo. Hoje nós somos amigos, mas não da mesma forma. Foi um choque para mim e abalou nossa amizade. Por outro lado, uma outra amiga com quem eu costumava ir a festas, e era engraçada, e a quem eu jamais recorreria nesta situação me ligava todos os dias, me convidava para jantar em sua casa com seu marido e filha, conversava sobre trocar meus médicos… Hoje temos uma amizade um milhão de vezes mais íntima do que seria se não tivéssemos vivido isso juntos.

O senhor acredita que hoje, a sociedade do aplauso, dos selfies e do facebook contribua para a depressão?
Eu acho que há um grande apelo sobre depressão hoje e a vida moderna traz dificuldades diferentes das enfrentadas cem anos atrás. Há cem anos seu filho morreria de febre tifoide e não há nada de bom nisso. Mas atualmente acho que as pessoas passam muito tempo interagindo com máquinas em vez de com outros seres humanos. Acho que pode ser muito alienante. As pessoas têm muitos amigos no Facebook, mas não estão de fato vendo ninguém, olhando nos olhos de outras pessoas, não há uma conexão íntima. Eu acho que o mundo está superpovoado, as pessoas veem muita TV e não dormem direito, mas quanto á internet, não acho um bom substituto para as relações humanas.

O senhor usa Facebook, Instagram?
Sim, uso de forma seletiva, não é nem um pouco desagradável, é bom estar lá e interagir com as pessoas. O problema é quando se substitui por uma intimidade mais autêntica e profunda.