Diretora de ELENA conversa com jornal mineiro
8 de abril de 2013

 

Entrevista de Petra Costa publicada em matéria de capa do caderno Cultura do jornal Hoje em Dia, de Belo Horizonte
Jornal Hoje em Dia, 06 de abril de 2013

 

QUANDO A DOR INSPIRA A ARTE

Pungente documentário da mineira Petra Costa tem exibição hoje, no Instituto Inhotim

Por Paulo Henrique Silva

Os fotógrafos não param de clicar a máquina quando Petra Costa está por perto. Tem sido assim em vários festivais de cinema onde seu primeiro longa-metragem, “Elena”, é exibido. Beleza que ganha um ingrediente triste no relato pessoal exposto em seu filme. O fato tem a ver com a sua irmã, cujo nome dá título à fita, falecida há 20 anos. Um trama que ela só superou ao transpor a história para a tela grande. Mas a diretora mineira pede à reportagem do Hoje em Dia para não adiantar detalhes.

O leitor mais desavisado, portanto, terá que comparecer hoje, às 14h, ao teatro do Instituto Inhotim, em Brumadinho, para encontrar todas as respostas. Após a exibição, gratuita, haverá mesa redonda com a pesquisadora Carla Maia.

Petra não estará presente. Ela se encontra na França, onde prepara seu próximo trabalho, mescla de ficção e documentário feita em conjunto com a dinamarque- sa Lea Glob. “É, de certa forma, uma investigação psicológica, mais uma vez voltada para trabalhar com aspectos femininos”. Confira, a seguir, trechos da entrevista.

Você insere o filme na safra recente de documentários que enfocam personagens que são muito próximos aos diretores, especialmente familiares, como “Otto”, de Cao Guimarães, e “Dias com Ele”, de Maria Clara Escobar?

Quando comecei a fazer “Elena” ainda havia poucos filmes brasileiros com enfoque familiar. Sabia da existência de “33”, do Kiko Goifman; “Passaporte Húngaro”, da Sandra Kogut; “Person”, da Marina Person, e de “Diário de Sintra”, de Paula Gaitán. Acho que foi o começo dessa safra, que hoje parece mais consolidada. Pensando em filmes estrangeiros, os que mais me tocaram foram “As Praias de Agnès”, da Agnès Varda, e “O Nome Dela é Sabine”, da Sandrine Bonnaire. Minha sensação é de que todo artista coloca muito de si, da sua intimidade, em sua obra, mesmo que não seja documental nem sobre pessoas da família. Mas, nesse tipo de filme, essa delicadeza e essa subjetividade ficam ainda mais aguçadas, o que só beneficia o cinema. Com o acesso mais fácil à tecnologia, creio que a tendência é que esse tipo de filmes se prolifere e seja uma tendência positiva de reflexão sobre temas universais de afeto, luto e perda. Partindo de experiências pessoais tem-se a possibili- dade de mergulhar com maior profundidade.

“Elena” representou também uma forma de vencer o trauma da perda da irmã?

Passaram–se 20 anos entre a perda de Elena e o momento em que comecei a fazer o filme. Os dez primeiros foram de elaboração do luto. Quando mergulhei no filme, o trauma já tinha passado e já me sentia preparada. Do contrário, seria doloroso demais. E achava que poderia ser valioso contar essa história, justamente porque aprendi muito nesse processo. Sobre perda e luto, e também em razão da minha própria experiência de encontrar identidade e autonomia por meio da arte.

Qual foi o momento mais difícil dessa reconstrução da vida de Elena? Foi quando assistiu aos vídeos caseiros? Ou foi ao ler o diário dela?

Um momento muito duro foi ler o relatório da autópsia e notar como a vida podia ser reduzida a tão pouco, que seu coração pesava 300 gramas. Foi quando senti a morte da maneira mais crua. Outro momento, mas esse imensamente prazeroso, foi ver as imagens de arquivo, as cenas de Elena dançando e brincando de encenar, algumas comigo no colo, quando eu ainda era um bebê. Ao assistir a esses vídeos, Elena tomou vida novamente diante de mim. Foi difícil por perceber que era um retorno fugaz, efêmero. Que ela não estava ali de verdade e que, de certa forma, voltaria a morrer.

O diário, por sinal, foi um motivador especial para a realização de “Elena”, não é verdade? Foi a maneira como você “entrou” na mente de sua irmã, fazendo o filme trilhar por uma narrativa psicológica?

Sem dúvida. Encontrei esse diário aos 17 anos e me identifiquei completamente com as palavras dela. Eram relatos de sensações existenciais profundas, que eu também sentia e não sabia como expressar. Foi quando decidi que faria um filme sobre ela. Diziam muito respeito a mim e, ao fazer o filme, tentei conduzir o máximo possível o espectador às viagens psicológicas que Elena viveu em Nova York – de euforia, solidão e desespero. Isso para que o público também pudesse fazer esse mergulho na mente dela. E da minha. (…)

Notei que o filme tem agradecimentos especiais a realizadores mineiros. Qual foi a colaboração deles?

Quando chegamos a um corte quase final, busquei mostrá-lo a alguns diretores e criadores que admirava para buscar o olhar distanciado e refinado deles. Entre os mineiros, estavam Sérgio Borges e Rodrigo Siqueira. O feedback deles e de outros foi muito importante para o processo final de elaboração. A gente fica um pouco viciada ao se dedicar por tanto tempo a um filme, principalmente sendo um filme tão íntimo, e precisa de um olhar mais distante, que esses criadores tiveram a generosida- de de compartilhar.



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