Filmar era a melhor forma de elaborar minha história

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A mineira Petra Costa tinha 17 anos quando, em uma aula de teatro, recebeu a tarefa de criar uma cena sobre o livro de sua vida. Procurando inspiração em casa, encontrou o diário da irmã 13 anos mais velha, Elena. No texto, escrito no fim da adolescência, reconheceu as mesmas angústias e inseguranças artísticas que sentia. Naquele momento, decidiu fazer não uma cena, mas um filme.

Esse filme é “Elena”, documentário premiado no Festival de Brasília que estreia nesta sexta-feira (10) em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Salvador. Hoje aos 29 anos, Petra faz um corajoso mergulho na trajetória de sua família, marcada por uma tragédia.

“Filmar era a melhor forma de conseguir elaborar a minha história”, afirma, em entrevista ao iG. ”Elena não é mais um trauma, mas sempre vai ser uma memória inconsolável, uma daquelas lembranças que não se apagam e, por isso mesmo, nos inspiram.”

A estreia do longa, o primeiro de Costa, responde à pergunta “Quem é Elena?”, tema de um vídeo amplamente divulgado nas redes sociais com breves depoimentos de artistas que de fato conheceram a irmã da diretora (Alexandre Borges, Ângelo Antônio e Fernando Alves Pinto), além de outros que assistiram ao filme e quiseram ajudar a divulgá-lo.

“Na hora da distribuição, me perguntaram por que o público veria um filme sobre alguém que não conhece. Então o vídeo teve o intuito de provocar curiosidade, além de usar os depoimentos que não pude deixar no filme”, explica Costa.

A diretora fez 50 entrevistas para o documentário, na tentativa de “saber o máximo possível sobre Elena”. No início do projeto, as memórias conscientes eram poucas, já que Costa tinha apenas 7 anos quando a irmã, sua grande referência na infância, foi estudar teatro em Nova York, onde morreu, aos 20.

Durante o processo de pesquisa, Costa leu os diários da irmã, assistiu a horas de filmagens feitas por ela durante a adolescência e foi para Nova York com a agenda de endereços que Elena mantinha em 1990. Procurou cada nome e encontrou vários, que lhe entregaram gravações da irmã fazendo um casting e dançando. “Para eles, eu era como uma aparição do passado”, define a diretora.

As entrevistas não são inseridas de modo convencional em “Elena”, cuja narrativa é centrada principalmente no off da cineasta, que fala direto à irmã, e não ao espectador. Recursos da ficção e as semelhanças de voz e aparências são utilizados de modo a por vezes criar dúvida sobre quem fala: Petra ou Elena.

“Pensei neste formato porque, mais do que uma história pessoal, de álbum de família, queria contar uma história dramatúrgica de confusão de duas irmãs”, afirma, citando “Um Corpo que Cai”, de Alfred Hitchcock, como referência.

A diretora também dá voz à mãe, Li An, cuja visita aos locais pelos quais Elena passou rende os momentos mais emocionantes do filme. “Para ela, ir a Nova York foi muito doloroso. Mas ela mergulhou de cabeça e, depois, sentiu alívio por poder compartilhar sua história”, diz Costa.

O fato de o pai fazer apenas uma breve aparição no documentário, pela dificuldade de falar do assunto, faz com que “Elena” se transforme também em um filme bastante feminino, em que três mulheres de gerações diferentes vivem questões e dores similares.

A diretora conta que sua intenção foi fazer uma espécie de versão feminina de “Bicho de Sete Cabeças”, longa de Laís Bodansky sobre um jovem enviado a um hospital psiquiátrico. “Tinha 17 anos quando assisti e me emocionei muito. Senti vontade de fazer o equivalente para jovens mulheres como eu, minha irmã, minha mãe e todas as outras.”

Costa também acredita que a trinca de personagens ajuda “Elena” a não ser um filme excessivamente triste e negativo. “Há uma história trágica, mas há duas histórias de sobrevivência. Acho que as pessoas podem se identificar com as três.”

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